sábado, dezembro 30, 2006

sábado, dezembro 23, 2006

Dia de Natal


É dia de meditar sobre a nossa existência,

tão efémera e tão séria.

Comove tanta fraternidade universal.

É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,

como se de anjos fosse,

numa toada doce,

de violas e banjos,

Entoa gravemente um hino ao Criador.

E mal se extinguem os clamores plangentes,

a voz do locutor

anuncia o melhor dos detergentes.



De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu

e as vozes crescem num fervor patético.

(Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino Jesus nasceu?

Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de pulso antimagnético.)



António Gedeão

sexta-feira, dezembro 22, 2006

A uma cerejeira em flor


Acordar
,
ser na manhã de abril

a brancura desta cerejeira;
arder das folhas à raiz,
dar versos ou florir desta maneira
Abrir os braços, acolher nos ramos
o vento, a luz ou o que quer que seja;

sentir o tempo, fibra a fibra,
a tecer o coração de uma cereja.



Eugénio de Andrade


Entre mim e o meu silêncio

gritos de
cores estrondosas

e
magias recortadas dos sonhos

que acontecem naturalmente.




José Luís Peixoto

sexta-feira, dezembro 15, 2006

quinta-feira, dezembro 14, 2006

Ausência


A ausência é um estar em mim.

E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.



Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, dezembro 13, 2006

Conheço o sal que resta em minha mãos
como nas praias o perfume fica
quando a maré desceu e se retrai.

A todo o sal conheço que é só teu,
ou é de mim em ti, ou é de ti em mim,
um cristalino pó de amantes enlaçados.


Jorge de Sena

quinta-feira, dezembro 07, 2006


"A experiência nunca é limitada e nunca é completa; ela é uma imensa sensibilidade, uma espécie de vasta teia de aranha, da mais fina seda, suspensa no quarto da nossa consciência, apanhando qualquer partícula do ar em seu tecido. É a própria atmosfera da mente; e quando a mente é imaginativa – muito mais quando acontece ela ser a mente de um génio – ela leva para si mesma os mais ténues vestígios de vida, ela converte as próprias pulsações do ar em revelações."


Henry James in The Art of Fiction